Avançar para o conteúdo principal

Eu ou história sem título

a) «O mundo só deixara de se tornar pequeno, quando as pessoas crescerem.»
Quando esta frase surgiu na minha cabeça parecia que fazia todo o sentido, agora para ser franca, já não sei muito bem o que quis dizer ao certo mas é sempre daquelas frases bonitas que se podem dizer… e porque não? É irónico que agora só escrevo quando estou a espera de algo.
Pensando bem, a minha evolução literária-narrativa é somente desenvolvimentos de introduções. Nunca vai mais longe do que isso. Pensamentos em estado bruto que pouco dizem e no entanto têm um jeito tão único de prometer tanto.

b) Hoje quis sentir-me bonita e vesti uma saia. Olhei para o espelho e devo confessar com aquele jeito de quem tem vergonha mal fingida que gostei da mulher reflectida no espelho. E não a confrontei, pelo contrário, admirei-a, e mais, agora, fiquei curiosa para a conhecer, saber afinal quem ela é. Às vezes, durante a noite, pergunto-lhe baixinho para que somente ela me oiça, sem perturbar o seu sono. Até hoje, não respondeu.
Muitas vezes não gosto de senti-la. Só gosto de olhar para ela. Senti-la é algo de amargo. Tradução de um nó no estômago e uma constante ansiedade que se sente e não consigo perceber donde vem…, não gosto de senti-la pois desconcentra-me dela e tento à força (inatamente) descobrir o que há lá fora que a possa ameaçar. Até hoje,nada.
Outro dia, eu e ela, falamos. Fazemos isso várias vezes ao dia. Normalmente, é ela que mete conversa. Suponho que se aborrece facilmente. Já lhe disse que talvez, o melhor, era voltar a ler mas como tudo na sua vida não poderia ser um calhamaço qualquer. A história nele capturado deve ser único e original e escrito de uma forma tão singular que só ela entenderia.
Ela, sou eu. Sei disso. E estou a espera e não sei do quê. Ela sorri. Passa a mão pela minha barriga e promete que me faz companhia.

c) Manteve a promessa.
Afinal ela sempre ficou, mesmo quando me foram buscar. Não falamos e nem olhamos uma para a outra. Há quem diga que o silêncio entoa mais que as palavras. Nesse ponto, talvez pela impaciência que a inexperiência dos poucos anos que tenho, eu discordo completamente. O que é que se descobre no vazio da voz? Para além de realmente termos tempo de decorar a estrutura física de quem está calado por companhia, não vejo ao certo o que posso apreender a não ser do que há sem palavras e sem discurso. Do que vem dela. Ela nunca se cala. Ela é um grito de rotações cerebrais estonteantes.
Nos dias não’s, deixo-a simplesmente falar. De tal forma que deixo o discurso dela correr, deixar que ela se canse no fluir dos movimentos fonéticos até estes serem simples rotações de língua. E aí, tenho silêncio. Silêncio de mim própria. Mas ao contrario do que se sucede com pessoas (pessoas reais), ficamos com uma sensação de alivio, frustração, raiva, tristeza, …, sei lá, depende de quem. Calar-nos a nós próprios, é como um electrodoméstico lembrar-se acariciar a si próprio. Ligar um simples botão escondido cá dentro nas entranhas (do qual ela de certeza não se lembra) e pôr-me em piloto automático.
Não sei se ela se zanga comigo porque nem me dou conta de quando as coisas voltam ao normal. Não que o fenómeno anterior não tivesse acontecido, é simplesmente…, não sei, não percebo. Não dou conta.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

A mão paleta

Não entristeças esse olhar manhoso de crocodilo velho Estou ocupada a limpar as manchas de: Azul-lilás, verde-azul limão com grenã e outra da minha mão paleta. E, assim, sou feliz Com cheiro a àgua rás.

18/100 – Soneto

Dedicado a João Horta, ps: as flores não se comem.. De dia nem existem assobios Rua quieta com gente inexistente Entre uma esquina e avenida sente-se diferente Ligeiramente nitroglicerina, sem boca, sem olhos Seu nome não está escrito em parte alguma O corpo, este, desencaixa-se dos hábitos É um autocolante da cidade dos danificados Talvez pertença aonde o seu regaço não se consuma É turista na terra de ninguém É dama-viagem, Dama-sem-vintém Dama de romance, do poema mas Dama sem miséria Sua vontade de faminta, é outra E se ela cola-se nos teus braços agora É porque também não a mandaste embora.

Or

Não te cobiço mais do que aquilo que te posso querer Não aguardo confiscar jamais esse teu burocrático desprezo Por isso, seja eu o que for não desejas: A pele esfolada, as carnes arrancadas por venerada dor Ou cor hemoglobina despejada de umas veias fracas que circulam neste cadáver ou melhor: neste esqueleto que segreda o teu amor.